Os recentes desdobramentos envolvendo a Ambipar e os prejuízos em Certificados de Operações Estruturadas (COEs) trouxeram ao debate uma verdade: mesmo em um mercado regulado e em plena expansão, fatos indesejados podem ocorrer.
Mais do que um episódio isolado, esse caso reforça a importância de princípios que sustentam a boa gestão patrimonial — a diligência, o respeito ao perfil de risco e a diversificação inteligente.
1. O início: uma expansão financiada por dívida
Desde o seu IPO em 2020, a Ambipar — empresa brasileira de gestão ambiental com presença global — adotou uma estratégia agressiva de crescimento. Foram mais de 70 fusões e aquisições em poucos anos, impulsionando a receita e a presença internacional.
O outro lado dessa trajetória foi o alto nível de endividamento. Ao final do segundo trimestre de 2025, a dívida líquida da empresa somava cerca de R$ 6 bilhões, e o mercado já começava a enxergar esse patamar de alavancagem como um risco relevante.
Além disso, desde 2023 a companhia vinha apresentando trimestres com prejuízo líquido, sinalizando que o ritmo de crescimento não estava sendo acompanhado pela geração de caixa.
2. O estopim: contratos de derivativos e crise de liquidez
A situação se agravou em 2025, quando veio à tona um problema envolvendo contratos de derivativos (swaps) relacionados aos títulos verdes (green bonds) da empresa no exterior, em operação com o Deutsche Bank.
Segundo a própria Ambipar, o banco teria imposto um aditivo contratual que gerou chamadas de margem — exigências de aportes adicionais de garantia — que, segundo a companhia, não tinham respaldo contratual.
O impacto foi imediato: mais de R$ 200 milhões foram desembolsados em poucos dias, pressionando fortemente o caixa e levando a uma crise de liquidez.
Em meio à turbulência, o diretor financeiro (CFO) João Arruda renunciou ao cargo, e a empresa passou a investigar possíveis irregularidades no contrato.
3. A resposta: tutela cautelar e o risco de recuperação judicial
Com o risco de vencimento antecipado de toda a sua dívida — estimada entre R$ 10 e R$ 15 bilhões — por cláusulas de cross-default (quando o não pagamento de uma dívida acelera o vencimento de todas as outras), a Ambipar recorreu à Justiça.
Em setembro de 2025, obteve uma tutela cautelar na Justiça do Rio de Janeiro — uma espécie de pré-recuperação judicial — que suspendeu temporariamente cobranças e execuções por um prazo inicial de 30 dias, prorrogável por mais 30.
Esse movimento abriu caminho para uma eventual recuperação judicial formal, caso a empresa não consiga reestruturar suas obrigações de forma consensual.
4. A ligação com os COEs: quando o risco corporativo atinge o investidor
Enquanto a Ambipar enfrentava essa crise, havia um grupo de investidores exposto à empresa indiretamente, por meio de COEs lastreados em títulos de dívida internacional (bonds) emitidos pela companhia.
Esses produtos, distribuídos por diferentes instituições financeiras, combinavam renda fixa com derivativos, e tinham como “ativo subjacente” o desempenho dos títulos de dívida da Ambipar — e, em outros casos, também da Braskem.
Capital protegido ou em risco: o que muda para o investidor
Nem todo COE oferece a mesma proteção. Existem dois tipos principais de estrutura:
Tipo de COE | Proteção do Capital | Risco de Perda | Perfil Ideal |
Com capital protegido | Sim (até o vencimento) | Baixo | Conservador / Moderado |
Com capital em risco | Não | Alto (pode perder tudo) | Arrojado / Experiente |
Nos casos da Ambipar e da Braskem, os COEs eram de capital em risco.
Ou seja: o investidor podia perder parte ou a totalidade do valor aplicado se o ativo de referência — no caso, as dívidas dessas companhias — se desvalorizasse.
E foi exatamente o que ocorreu.
Quando o mercado internacional passou a duvidar da capacidade de pagamento dessas empresas, os preços dos bonds caíram fortemente.
E essa queda acentuada ativou as cláusulas de liquidação antecipada dos COEs, encerrando os produtos antes do prazo e devolvendo aos investidores entre 6% e 36% do capital investido, dependendo da estrutura.
No caso da Ambipar, o retorno médio ficou em torno de 6,88% do valor aplicado — uma perda de mais de 90%.
5. Um alerta sobre incentivos e desalinhamentos
Fatos como esse são um lembrete importante para todos que atuam no mercado financeiro: situações indesejadas podem ocorrer, mesmo entre empresas de grande porte.
É por isso que princípios como diversificação, diligência e respeito ao perfil de investidor nunca foram tão evidentes quanto agora.
A verdadeira gestão patrimonial não se resume a escolher produtos, mas a construir carteiras capazes de atravessar ciclos e resistir a imprevistos. Por isso, manter um processo de estudo constante, de proximidade com o que o mercado está explorando com uma avaliação criteriosa dos riscos, ajudará a mitigar cenários adversos e preservar o capital.
6. O que o investidor pode fazer agora
Mesmo que você não tenha sido impactado diretamente, o caso deixa lições importantes:
- Compreenda os ativos subjacentes de cada investimento.
- Desconfie de promessas de proteção total com rentabilidade acima da média.
- Questione sempre os incentivos por trás da recomendação.
- Busque clareza antes de buscar rentabilidade.
E, sobretudo, lembre-se: investir é um processo de longo prazo — não um evento de oportunidade.
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